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Flávio de Castro: Águas

08/02/18 - 18:24

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Minha mãe é da Zona da Mata, de uma pequena cidade perto de Viçosa. As minhas lembranças mais antigas são de viagens de férias para a casa de seus familiares, lá. Lembro-me do cheiro da cidade, um cheiro de lenha, de madeira. Muitos dos seus parentes, como era comum, eram homens do campo que moravam no campo. Campo, então, pouco tinha a ver com o que a gente entende por campo, hoje, contaminado pela vida urbana. Ainda que as casas fossem simples, eram casas antigas. Nessas fazendas, nas estradas de terra enlameadas, nas dificuldades de acesso, reside a minha memória mais intensa do que seja o período das águas. Dias e dias sob um dilúvio infindo até o limite. O limite anunciado pela falta de sol, pelo tempo sempre escuro, pela umidade indo até os ossos, pelo frio noturno, pelo barulho de chuva que deixava de ser agradável e começava a parecer ameaçador. O limite que levava a alma a se fechar numa tristeza danada. Nesses tantos anos de vida, desde aquela longínqua infância, poucas vezes fui tomado por essa tristeza úmida, como nesse janeiro de 2018.

 

É verdade que, agora, a consciência da maturidade ajuda a conviver com esse estado de melancolia, o que era impossível, pra mim, meio século atrás. Você recebe de um grupo de amigos um vídeo com o Rio Cipó quase transbordando, ali perto da ponte, ao lado do Hotel Veraneio, e sabe que tem que comemorar. Um minuto depois, você recebe outro vídeo do Velho Chico, na cidade de São Francisco, no seu nível mais alto, e sabe que isso também é motivo de felicidade.

 

Esse súbito sentimento, tão dúbio, me faz pensar em quanto a vida urbana, excessivamente tecnológica, hiperlinkada, nos leva a reparar pouco nos estados de alma que a natureza nos impõe. Na aflição dos dias de seca, quando, na estrada, você vê a paisagem marcada por fumaças de incêndios; no cansaço dos dias de sol escaldante, na cidade, sem uma árvore para amenizar; no prazer de um dia frio em que você se sente incomumente disposto. Aí, entre tristeza, felicidade, aflição, cansaço e prazer, você acha, sem prensar, que vive apenas um estado pior ou melhor de saúde e não se dá conta de que, na verdade, você está, simplesmente, sintonizado com o tempo. “Tempo, tempo, tempo, tempo, não serei, nem terás sido!”

 

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