Warlem Dias: “É preciso saber tecer saberes, cultivar o encontro com o outro”

12/09/18 - 12:00

Sabedoria e fé são constantes na busca inconstante do padre Warlem Dias, pároco da Igreja de Nossa Senhora das Graças e colunista do Jornal SETE DIAS. Em busca da luz que ilumina mentes e corações, padre Warlem faz da palavra ao homem o sacerdócio que Deus lhe incumbe: ide e evangelizai,. Na entrevista a seguir, conheça os caminhos, pensamentos e ações de Warlem, o jovem que sempre sonhou em ser padre.

 

Como e quando percebeu o despertar do sacerdócio em sua vida?

PW - Ainda criança, quando meu pai perguntava, diante de minha avó, o que seria quando crescesse. Respondia: padre. Fiquei com isso na cabeça. Contudo, não tenho muito a ideia de como surgiu, pois o contato com padre era mínimo, só de “missa”, no São Geraldo. Só via o padre num Jeep, e bem longe. Talvez, meu pai contou a história do filho de amigo que foi para o seminário. Até quando conclui o “primário” ainda pensava.

O tempo passou, a ideia diminuiu, me distanciei da Igreja. Porém, ao envolver-me com grupos jovens, reapareceu o desejo. Faltava sempre padre na minha comunidade. Então, pensei ser padre para a minha comunidade. Ali, bem pertinho das pessoas que conhecia. Já estava com os 21 anos quando voltei a pensar, trabalhava na Cossisa, estava sem estudar e só olhava as mulheres. Então, vamos para o Seminário, ficar mais perto de Deus, neste lugar de anjos, com uma asa quebrada.  

 

O que significa para o senhor transmitir aos fiéis as mensagens de Jesus Cristo?

PW - Tomo aqui o número 18, do Documento de Aparecida, colocando no singular: “Conhecer Jesus pela fé é minha alegria; Segui-lo é uma graça, e transmitir este tesouro aos demais é uma tarefa que o Senhor me confiou ao me chamar e me escolher”.  Agora, cada um, ao ler, ponha no plural, pois é para todos nós cristãos e cristãs, ordenados ou não. 

Certa vez, numa celebração com o padre Tarcizo, nos inícios de ministério, disse: “Que poderia deixar de ser padre, mas não deixaria o Evangelho”. Tem horas que, diante do texto sagrado, nas descobertas e naquilo que fala para mim, me contorço e esfrego as mãos. Na hora em que proclamo, quando sinto o meu arrepiar nos pelos, fico muito feliz.  Também, às vezes, sinto dificuldades diante da Palavra que incomoda, por não vivê-la, tal qual. Fico triste, pois transformamos, na maioria das vezes, o Evangelho em doutrina ou numa moral e espiritualizamos à nossa maneira. Levamos pouco as pessoas ao encantamento pelo Evangelho. Sinto que, na maioria das vezes, não consigo dar ao Evangelho a beleza que ele tem, com minhas tamanhas explicações. Preferiria os pequenos grupos de partilha comum. Sou grato a este Evangelho que me ajuda a ser mais gente.

 

Como colunista, quais temas são os mais caros em sua avaliação, para que o leitor tenha sempre um diálogo com o senhor?

PW - O tema referencial é Eclesiológico, a Igreja nos mais diversos enfoques: hoje com as imagens do papa Francisco, um hospital de Campanha, Samaritana... Uma Igreja menos autorreferencial, menos institucional, menos templo, menos poder. Outra decorrência é a Igreja que se envolve com o mundo dos pequenos, dos simples, dos pobres e excluídos. Dai, a importância das CEBs, das pastorais sociais. Ainda, tem que se pautar a Igreja aberta, ao diferente, ao outro, ao ecumênico e ao diálogo inter-religioso. Nisto adiciona-se o meu gosto pela Sociologia, leitor de Zygmunt Bauman; na Antropologia, Balandier; na Politica e poder, o clássico Maquiavel, Bordieu;  e no imenso Sertão, Rosa, e na Caatinga, Elomar.

 

Infância, juventude, seminário: quais fatos marcantes em sua trajetória?

PW - Na minha infância o marcante era a rua, meio pai era meio bravo, e nos privava da rua, ela era o espaço de liberdade. Os campinhos, o futebol, a nossa pobreza... O tempo, as chuvas e o frio. Nosso aconchego, no cuidar uns dos outros. Tínhamos que cuidar da casa, nossa mãe trabalhava fora, era eu que fazia a comida para os demais. Na juventude não fui de badalação, era quase quieto, no espaço caseiro, sempre o tal de “bom exemplo”. Não fui de namorar, mas amava as mulheres. No Seminário, o que me marcou foi a minha expulsão no ano de 1985, com justa causa: ironia e indisciplina. 

 

Viver nos dias de hoje é administrar valores e crenças diferentes. Como o senhor lida com essa questão?

PW - Muito bem, cada um tem os seus valores e suas crenças. Nada de mais frutuoso que o saber ouvir, acolher, aprender e dialogar na construção de um bem-viver. Nós vivemos uma riqueza de valores e crenças, uma pluralidade em fragmentos. É preciso saber tecer saberes, cultivar o encontro com o outro, como o cosmo. Isso implica em acolhida, fortalece a identidade. Numa época de opiniões, onde os achismos pululam, as redes sociais fomentam violências nos mais diversos fundamentalismos. É preciso saber trabalhar no meio de tantos contra-valores.  

 

O papa Francisco afirma que todo cristão deve, sim, se importar com a política. Em qual sentido o senhor interpreta essa mensagem?

PW - A Missão da Igreja é no mundo e para o mundo. Não é pra se trancar ao se fechar em si  mesmo. Paulo VI disse: “A politica é a melhor forma de exercer a caridade”. Por tempos, os cristãos passaram a viver fora do mundo, com Igreja nas nuvens, só rezando. A partir de Medellín, ganha novo toque, para agir e se integrar politicamente nas periferias da América Latina. 

Na maioria, desconhecemos a doutrina social da Igreja e os pobres da Igreja, que desde o inicio marca por ações social e politica. Portanto, a fala do papa Francisco não é novidade, ele só faz recordar e chama a se retomar este caminho.

 

Por falar em mensagem, o que o senhor diz, nesta entrevista, para que cada um de nós seja mais humano, fraterno e justo?

PW - Dois toquezinhos bíblicos: “Nós carregamos preciosidades de Deus em vasos de barro” 2Cor 4,7; “Ninguém fique devendo nada a ninguém a não ser o amor, pois o amor não deve nada a ninguém” Rm 13,8. Cuidado e amor. No fim de tudo, o que nos gratifica é o amor. Precisamos voltar à vocação, à sensibilidade, reconhecer o outro como lugar da epifania de Deus. Viiver a solidariedade humana, fazer desta casa um lugar habitável e palatável para todos.

 

 

QUEM É PADRE WARLEM DIAS - Warlem Antônio Ferreira Dias nasceu em Sete Lagoas. É filho de  João Ferreira Dias e de Maria José Dias. Solteiro, estudou  na Escola Estadual Modestino Andrade Sobrinho (1º ao 4º); Escola Estadual Maurilo de Jesus Peixoto (Técnico em Contabilidade);  fez o curso de Filosofia na FAI – Faculdades Associadas Ipiranga (1992), Teologia no Instituto Dom João Resende Costa,  (1990) – Faculdade Nossa Senhora Assunção (1998) e Especialização em História da Igreja na América Latina. Ordenado em 02 de fevereiro de 1991 pelo bispo Dom José Lima.

 

Como padre da Igreja Católica Apostólica Romana, esteve nas paróquias  Divino Espírito Santo/SL (fevereiro de  1991 a  agosto de 1993),  Santo Antônio (Prudente de Morais) e Nossa Senhora da Conceição (Capim Branco)  entre agosto de 1993 a dezembro de 1995. Em seguida,  em Santa Maria Goreti e Santíssima Trindade (SP) no período de janeiro de 1995 a julho de 1998. Depois, foi pároco  em Senhor Bom Jesus (Matozinhos) durante o período de julho 1998 a janeiro de 2001. Em fevereiro de 2001, assumiu a Igreja da  Imaculada Conceição em Sete Lagoas, até março de 2007, de onde serviu na Igreja de Santa Teresa dos Andes de março de 2007 a fevereiro de 2013. Desde fevereiro de 2013 é o pároco da Igreja de Nossa Senhora das Graças.

 

 

 

 

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