Estudo de 1988 aponta que caverna pode chegar a 50m de profundidade

O geólogo Adelbani Braz da Silva, em 1988, já apontava uma série de causas do abatimento do solo que, como o estudioso alertou na época, poderia se repetir

20/04/23 - 09:59

Celso Martinelli

A Prefeitura de Sete Lagoas continua trabalhando na região do bairro Santa Luzia onde, no dia 2 de abril, foi identificado um abatimento no solo no encontro das ruas Tupiniquins e Nestor Fóscolo. As intervenções começaram logo após o registro e ganharam intensidade nos dias seguintes. No primeiro momento, o objetivo é saber se o fenômeno tem causas superficiais. Porém, já está definido que um estudo geológico profundo será realizado no local e o processo de contratação do profissional da área está em andamento.

A ocorrência gerou grande preocupação já que, em 1988, uma cratera consumiu parte das ruas neste mesmo local. Desta vez, houve menor gravidade com rebaixamento e trincas no asfalto. Com o movimento, ocorreram rachaduras no muro de um imóvel que precisou ser demolido e uma proteção foi erguida pela Prefeitura. “Estamos realizando escavações superficiais para saber se existe alguma fissura que possa ter motivado esta acomodação. Paralelo a este trabalho de campo, estamos contratando um estudo geológico para obter um pleno conhecimento do subsolo desta área”, explicou Antônio Garcia Maciel, secretário municipal de Obras.
No entanto, estudo feito pelo geólogo Adelbani Braz da Silva, em 1988, já apontava uma série de causas do abatimento do solo que, como o estudioso alertou na época, poderia se repetir. “As investigações hidrogeológicas e as medições dos níveis d´água durante as sondagens mecânicas mostraram que existem dois aquíferos naquela área. Um superior, livre, localizado acima da rocha decomposta argilosa e que tem a superfície freática situada a 5m de profundidade. O outro aquífero é confinado por estas rochas argilosas e esculpido na rocha carbonática. O nível da superfície da água deste aquífero oscila muito, variando de 52m de profundidade à apenas 4m”, relatou.

Na ocasião, as causas apontadas foram:

“O fenômeno que ocorreu em Sete Lagoas foi de origem natural e não identificou-se qualquer influência antrópica no processo do abatimento do solo. Não foi observada qualquer relação entre os poços tubulares que abastecem a cidade de Sete Lagoas e a formação da depressão.
O modelo teórico da evolução do abatimento de Sete Lagoas mostra inicialmente que houve um desabamento do teto da rocha carbonática da caverna existente no subsolo ou um lixivia mento intenso das rochas decompostas sobrepostas à caverna.  Tal lixivia mento teria sido acelerado, talvez, por uma percolação pontual de água que careou o material decomposto da rocha através de fraturas existentes no teto da caverna. Estes fatos geraram uma instabilidade das rochas argilosas sobrepostas à caverna e, consequentemente originou pequenas rachadas verticais Este rebaixamento, por outro lado, pode ter sido estimulado pelo rebaixamento natural da água subterrânea devido a estiagem prolongada ocorrida no ano anterior.
Após o rebaixamento natural da água subterrânea confinada e com a acomodação, também natural, dos terrenos superficiais constituídos de rochas incoerentes, houve uma obstrução da chaminé e a volta da separação, pré-existente, dos aquíferos livre e confinado.
Esse quadro atual é instável e a retomada do processo de erosão e desabamento está condicionada ao comportamento dos níveis de água subterrânea dos aquíferos livre e confinado, como também de instabilidade do teto da caverna subjacente”.
Dentre as conclusões a partir do estudo realizado, o geólogo Adelbani Braz da Silva fez alguns alertas importantes:
“O abatimento ocorrido em Sete Lagoas foi decorrente de um fenômeno natural, aparentemente sem influência antrópica.
A circulação de água subterrânea na caverna não pode ser interrompida com entulhos porque provocará a ascensão da água subterrânea e consequentemente ocorrerá erosão subterrânea ou desabamentos em vários outros locais nas vizinhanças da atual depressão.

As zonas de dissolução das rochas (cavernas, canais, etc) são profundas (superiores a 50m). Este fato diminui a probabilidade de ocorrência de abatimento abrupto do solo em outros pontos da cidade de Sete Lagoas.

Grande parte da cidade de Sete Lagoas está edificada sobre um substrato de rocha carbonática com importantes zonas de dissolução subterrânea. Estas zonas de dissolução estão sujeitas a colapsos naturais semelhantes ao ocorrido recentemente.

A água subterrânea próxima ao local do abatimento do solo poderá ser aproveitada para o abastecimento público, uma vez que o volume a ser extraído através de poços tubulares não interferirá no equilíbrio das rochas carbonáticas.


RECOMENDAÇÕES FEITAS EM 1988

“A depressão existente e caverna no subsolo não devem ser obstruídas, porque não é possível estabilizar seguramente o aterro subterrâneo nem deve ser interrompida a circulação natural das águas subterrâneas.

Deve-se isolar de imediato, no mínimo, a área afetada pela acomodação do solo e demolir as edificações ali existentes. Esta área atinge aproximadamente 40m de distância da depressão existente.

Aconselha-se a urbanizar o local e diminuir os taludes das margens do buraco. O enroscamento existente deve ser refeito com a gradação granulométrica do material fino até os blocos de pedras, para melhorar a proteção do talude contra a erosão.

É necessário a implantação de uma drenagem permanente das águas para evitar a reativação da erosão. Esta drenagem deverá rebaixar a água subterrânea e evitar as entradas de águas superficiais na depressão;

É importante o monitoramento permanente da área atingida para observar o comportamento da depressão e para detectar possíveis reativações dos processos naturais.

Antes da construção de qualquer edificação de grande porte na cidade de Sete Lagoas devem ser realizadas sondagens mecânicas para conhecimento das características geológicas locais do subsolo profundo”.


Recentemente, a Prefeitura de Sete Lagoas informou em nota que o processo ganhou status emergencial e, com isso, a contratação da empresa especializada em geologia será de maneira ágil. “A intenção é resolver a situação de vez e garantir mais tranquilidade para moradores e comerciantes da região o mais rápido possível”, consta no informe.

Último tremor foi registrado no dia 28 de dezembro

Em 2022, os sete-lagoanos sentiram com grande frequência tremores de terra que tiraram o sono de muita gente. O último registrado foi no dia 28 de dezembro de 2022, por volta das 00h42. Um barulho semelhante a um trovão seguido de tremor foi sentido em vários bairros da cidade. Os dois principais centros sismológicos do país, o da Universidade de Brasília (UnB) e o da Universidade de São Paulo (Usp), registraram o fenômeno, com 2.8 e 2.9 graus na escala Richter, respectivamente.

A região não registrava esse fenômeno desde o último dia 24 de novembro, quando os centros sismológicos registraram um tremor de magnitude 2.2. O fenômeno, que não ocorria na cidade desde 2017, voltou com maior frequência este ano. De acordo com dados da UnB, foram registrados 53 tremores em 20 cidades mineiras, 12 deles em Sete Lagoas, com intensidade variando entre 1.9 e 3.0. Já a Usp identificou 81 abalos em 21 municípios de Minas Gerais, sendo 20 deles em Sete Lagoas, com tremores variando entre 1.5 e 2.9.
Para ambos os centros sismológicos, o município mineiro campeão em tremores é Divinópolis, com 17 ocorrências segundo a UnB, e 36 casos de acordo com a Usp, todas entre janeiro e fevereiro desse ano. Sete Lagoas fica na segunda posição. Somente em 2022 também foram identificados pela UnB tremores nas cidades mineiras de Baldim, Capim Branco, Carmo do Cajuru, Conceição do Mato Dentro, Curvelo, Esmeraldas, Felixlândia, Fronteira, Frutal, Joanésia, Montes Claros, Nova Lima, Pompéu, Prudente de Morais, Santo Hipólito, São Gonçalo do Pará, Tiros e Uberlândia. A Usp também relatou o fenômeno em Funilândia, Ibirité, Ibituruna, Matozinhos, Mesquita, Morada Nova de Minas, Pedro Leopoldo, Pescador, Poços de Caldas, Presidente Juscelino e Senador Cortês. Em todo o país, foram 125 tremores registrados pela UnB e 166 pela Usp.
Segundo o professor George Sand, pesquisador do Centro Sismológico da UnB, possivelmente trata-se de um fenômeno natural. "Não tem influência externa. Um tremor dessa magnitude teria que ser uma explosão muito grande para causar esse tremor que afete a população. Agora precisamos analisar o local exato em que esses fenômenos ocorrem e identificar possíveis danos", afirma. "As falhas geológicas estão sob pressão o tempo todo e Sete Lagoas tem regiões de falhas que às vezes se deslocam, provocando os tremores, mas são magnitudes baixas (abaixo de 3.0 na escala Richter)", lembra o pesquisador.
Defesa Civil
O coordenador da Defesa Civil Municipal, comandante Sérgio Andrade, reforça que, em caso de notar rachaduras ou trincas na residência após um tremor, o cidadão deve acionar imediatamente a Defesa Civil pelo 153. "Estamos atuantes desde o primeiro abalo registrado esse ano e monitorando constantemente as regiões onde os abalos são registrados. Até o momento não tivemos nenhum registro oficial ou chamado de danos materiais ou humanos", esclarece. Ainda é aguardado pela administração relatório que detalhe melhor de onde partem os abalos sísmicos que, quando ocorrem, podem ser sentidos em quase toda a cidade.
 

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