Campanha Setembro Amarelo reforça a importância da prevenção ao suicídio

10/09/19 - 13:09

O engenheiro Madson Ferrari criou um canal no Youtube como terapia para sair da depressão
O engenheiro Madson Ferrari criou um canal no Youtube como terapia para sair da depressão

Embora a depressão seja um dos fatores principais para que alguém atente contra a própria vida, ela não é o único. Saiba como identificar comportamentos depressivos e onde buscar ajuda

 

Setembro é um mês de várias cores. Pode ser roxo pela conscientização e divulgação da fibrose cística; azul pela representatividade surda; laranja pelo combate à obesidade infantil; vermelho no combate às doenças cardiovasculares; verde em favor da doação de órgãos e da inclusão social; e amarelo no combate ao suicídio. 

 

Além de problemas mentais mais graves, um dos fatores que mais levam à atitude extrema de tirar a própria vida está a depressão. Não que todo depressivo seja um potencial suicída. Porém, a Associação Brasileira de Psiquiatria – ABP (2009) aponta um elo entre o comportamento suicida e os transtornos mentais. Os dados comprovam que, de 15.629 pessoas que suicidaram naquele ano, 90% dos casos enquadrariam em algum transtorno mental. A depressão se destaca com o índice de 35,8% dos casos de suicídio. 

Considerada "a doença do século XXI", a depressão é caracterizada por sintomas como tristeza, desesperança, falta de motivação e desinteresse pela vida. E esses fatores também são influenciadores no comportamento suicida. A relação da depressão com o suicídio está ligada a diversos fatores que se enquadram no social, pessoal e psíquico.

 

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O corpo emite alertas em situações de depressão

 

Já o suicídio é um problema de saúde pública que mata pelo menos um brasileiro a cada 45 minutos, segundo dados do Ministério da Saúde. Mais do que a Aids e muitos tipos de câncer, porém, pode ser prevenido em 9 de cada 10 casos. Esse número já deveria ser suficiente para estimular as pessoas a se mobilizarem pela prevenção dessas mortes precoces, mas apesar dos avanços, os tabus, preconceitos e vergonhas ainda são adversários nessa luta. O movimento Setembro Amarelo, mês mundial de prevenção do suicídio, iniciado em 2015, visa sensibilizar e conscientizar a população sobre a questão. "É como se você não enxergasse um palmo à frente. Você desiste de tudo. Não vê possibilidade, perspectiva de nada. 

 

MOVIMENTO 

Durante todo o mês de setembro diversas ações serão vistas em todo o Brasil como parte do movimento Setembro Amarelo para chamar a atenção da população para esse problema. "O suicídio é um assunto complexo, pois ninguém se mata por um único motivo, mas a prevenção é possível e algumas ações podem ser feitas por todas as pessoas", comenta a voluntária e porta-voz do CVV, Leila Herédia. Segundo Leila, permitir que as pessoas desabafem e falem sobre seus sentimentos sem receber críticas é um meio de evitar que se busque na morte a solução para suas dores. "A morte em si já é um tabu. Morte por suicídio é ainda mais complicado, pois toca em questões de escolhas, crenças e barreiras sociais", explica a voluntária ao comentar os motivos da falta de divulgação e debate sobre o assunto. 

 

SETE LAGOAS 

De acordo com a voluntária do CVV de Sete Lagoas, Camila Costa, não é possível apontar dados estatísticos de atendimentos específicos da cidade, já que o telefone 188 foi unificado em todo o país há dois anos. "Nós recebemos ligações do Brasil inteiro. Dificilmente vamos atender uma ligação de alguém de Sete Lagoas", explica. Porém, alguns números nacionais podem ser aplicados à realidade local. As ligações aumentam consideravelmente no final de ano, domingos e feriados. "É quando muitas pessoas se sentem mais sozinhas", lembra a voluntária. "Em setembro, em função da campanha Setembro Amarelo, também recebemos mais ligações", completa. "Quando ligam, querem alguém que as escute. Principalmente no telefone, é muito mais questão de solidão mesmo. Há também ligações por motivo de melancolia, depressão e sentimentos suicidas", informa Camila. 

Em Sete Lagoas o CVV conta atualmente com uma média de dez voluntários plantonistas, que atendem exclusivamente pelo telefone 188 ou online pelo www.cvv. org.br. Somando todas as 110 unidades do Centro, são mais de três milhões de chamadas por ano. Se estiver passando por algum problema relacionado à depressão, disque 188 e busque ajuda 

 

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Arte em prol da campanha Setembro Amarelo

 

PAULA FERNANDES 

A cantora Paula Fernandes abriu o jogo sobre a depressão que enfrentou aos 18 anos no quadro do Fantástico 'Não tá tudo bem, mas vai ficar', exibido início de agosto e comandando pelo Dr. Drauzio Varella. A sertaneja sete-lagoana se emocionou ao relembrar o apoio da mãe, Dulce de Souza, durante o momento mais difícil da sua vida. "Escolhi a janela. Eu ia pular, porque estava tomada. É como se você não enxergasse um palmo à frente. Você desiste de tudo. Não vê possibilidade, perspectiva de nada. Achava que tinha sido derrotada...Minha mãe se desesperou, com medo de fazer um movimento e eu saltar. Abracei a minha mãe. Aquele momento, eu jamais vou esquecer. Foi a minha mãe que me salvou", detalhou a artista em um trecho da entrevista. Paula contou que sentiu os primeiros sintomas da doença aos 16 anos, mas achava que era algum problema cardíaco. "Dor de cabeça, taquicardia. Passava o dia inteiro tremendo no sofá. Tinha dia que eu tinha crise de taquicardia que parava no hospital com não sei quantos batimentos por segundo. Achava que ia morrer. E uma falta de ar absurda." A depressão paralisou a artista, que se viu incapaz de comprar um pão sozinha. "Eu não entendia porque não tinha consciência ainda. Quando a minha depressão chegou no ápice - de 0 a 10 chegou a 9 -, o meu cabelo já tinha caído bastante, perdi 7 kg num espaço de tempo curtíssimo, porque eu já não comia." 

 

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Paula Fernandes falou sobre depressão e suicídio em quadro do programa Fantástico, da TV Globo

 

AJUDA 

O Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, e-mail e chat 24 horas todos os dias. Se estiver passando por algum problema relacionado à depressão, disque 188 e busque ajuda. Nas redes: @setembroamarelo www.cvv.org.br www.setembroamarelo. org.br 

 

SE SENTIR ÚTIL AJUDA NO CONTROLE DA DEPRESSÃO 

O engenheiro Madson Ferrari Pereira, 53 anos, trabalha na Iveco de Sete Lagoas, passou por situações de depressão e encontrou na produção de vídeo-aulas para o Youtube, além do acompanhamento profissional, a solução para controlar o problema. "Descobri que tinha depressão após ficar com tonteira e ansioso em uma situação de stress. Foi difícil, pois a pessoa fica emotiva e não sente prazer com nada. O quadro acaba agravando. Muitos até se preocuparam, pois é algo grave. Mas alguns ainda acham ser bobeira. Procurei psicólogo e psiquiatra. Ainda estou em tratamento com ambos", conta o engenheiro. A ideia de montar um canal no Youtube surgiu porque Madson precisava de algo que o fizesse se sentir importante, que fosse algo útil. Nos vídeos, ele ensina a consertar equipamentos eletrônicos, a fazer pequenos reparos domésticos e dá dicas de inglês. "Os vídeos são feitos com celular e editados no computador enquanto eu reparo produtos ou quando preparo as aulas de inglês. Eles têm me ajudado na interação com as pessoas. Você receber elogios do seu serviço, que é feito grátis, isso ajuda muito na autoestima", revela. 

O feedback, segundo o engenheiro, tem sido positivo. "As pessoas perguntam, dão dicas e querem saber mais sobre o assunto". Já são mais de 500 inscritos e mais de 30 vídeos no canal youtube. com/user/MadsonFerrari Madson não chegou ao extremo de pensar em tirar a própria vida. "Graças a Deus eu não pensei em nenhum momento nisso por ser uma pessoa que já tem uma inclinação religiosa desde o nascimento e por ser acompanhado por psicólogo desde o início da crise. Isso tem me ajudado muito a superar. Hoje me sinto curado, mas os médicos dizem que é necessário continuar por no mínimo seis meses para interromper a medicação", conta. 

 

QUANDO A DEPRESSÃO LEVA A PENSAMENTOS DESTRUTIVOS 

O empresário Maurício Bruno de Souza, 43 anos, enfrentou uma barra mais pesada e confessa que chegou a pensar em auto-extermínio. "Só descobri que tinha depressão quando comecei a sair dela. Foi muito sofrimento. Fiquei de 2011 até 2015 no fundo do poço. Eu morava em Contagem na época. Vim para Sete Lagoas exatamente para mudar, para ter qualidade de vida", lembra. 

Ele conta que, no auge da crise, se enclausurou, parou de trabalhar, quebrou telefone, vendeu tudo o que tinha até o patrimônio acabar. "Dormia 20 horas por dia. Não conversava com ninguém, nem dentro de casa. Me isolei. Ninguém sabia que eu estava doente. Só eu, minha esposa e meu filho. Na época eu não procurei ajuda. Foi quando um amigo me procurou, começou a me tirar de casa e eu percebi. Mas ainda tenho recaídas, sou um pouco depressivo. Hoje procuro ajuda médica, algo que deveria ter feito antes de chegar na fase crônica", confessa. Segundo o empresário, a ideia da morte era constante. "Eu só pensava em me matar. Era um pensamento diário. Como tenho um filho autista, eu pensava muito em como seria a vida dele sem mim. Isso me segurou. Acreditava que dar fim ao meu sofrimento seria me matar, matar todo mundo, era um pensamento muito triste", lamenta. Hoje, porém, Maurício afirma lidar bem com a situação. "Não sou curado, mas consigo me controlar. Sei identificar quando tenho recaídas. Nesses momentos, me policio e começo a procurar algo para melhorar". 

 

VIDA E MORTE 

De acordo com o psiquiatra Pérsio Ribeiro Gomes, suicídio e depressão são muito relacionados. Mas é muito importante ressaltar que nem todas as pessoas que apresentam um transtorno depressivo têm o risco de cometer suicídio. A tendência a tirar a própria vida está relacionada a alguns fatores. "Os principais são a gravidade do quadro depressivo, o uso de álcool e drogas, situações existenciais pessoais e a presença de traumas psicológicos, como os abusos sexuais infantis", enumera. Para o terapeuta, a dificuldade ou recusa em buscar ajuda ou tratamento faz com que a doença evolua progressivamente levando o indivíduo à total falta de energia. "O 'eros' é vencido pelo 'tanahos', na acepção de Freud, ou, numa linguagem mais simples, o impulso que nos direciona à vida é sobrepujado pelo impulso que nos direciona à morte", completa. Independentemente da motivação, o mais importante é buscar ajuda, seja ela da família, de amigos, de entidades como o CVV e também profissional. Afinal, a vida sempre vale mais.

 

Marcelo Sander

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