Folheando o jornal “A Rua”, deparei-me com um artigo que relembra os antigos carnavais, em nossa cidade, do início do Século XX (21-02-1915). Esse “Semanário Noticioso” – conta o saudoso jornalista Márcio Vicente – circulou, aos domingos, por pouco mais de seis meses (17-01-1915 a 26-09-1915), com 36 números, tendo, como Diretor, o Dr. Arthur de Seixas Souto Maior (redator-chefe), e, como Redator, Manoel Tecles (100 Anos de Imprensa, 1894/1994: Os Jornalistas de Ontem e de Hoje. Sete Lagoas: Edições Instante, 1994).
Imerso, que estou, na história de Sete Lagoas, é sempre bom recordar, para a satisfação do leitor, o que faço com a republicação da bela crônica: “Carnaval: Poucos dias antes dos festejos carnavalescos, notava-se uma indiferença que fazia prever muita frieza nos folguedos do carnaval. Chegado que foi o domingo carnavalesco, a alegria inundou todas as almas e no meio de sorrisos galantes, gargalhadas francas estridentes, desopilantes, flores, música, confete e lança- perfumes, Deus Momo implantou o seu império do riso e da loucura.
Muitos mascarados passeavam nas principais ruas da cidade, dando com sua vozeria e variedade de cores de suas vestimentas, um tom alegre à cidade. À noite, um préstito carnavalesco, promovido pelo intrépido amador de Momo – o Sr. Rosas, em ruidoso Zé Pereira – aumentou o entusiasmo que a todos dominava.
Afinadas bandas de música, executando esplêndidas peças apropriadas ao dia, como ‘Vem Cá Mulata’, ‘Chourucubaca’, ‘Requebra Dudu’, ‘Tempera Mano’, ‘Eu Te Desconheço’, etc., encantaram, deliciaram os nossos ouvidos. Junto a cada um dos três coretos, onde essas bandas tocaram o maxixe e o tango, fizeram prodígios de requebras e meneios. Era um gosto ver o pessoal! As batalhas de confetes e lança-perfumes foram renhidíssimas, tomando nelas parte a escol de nossa sociedade. Gentis e galantes senhorinhas, distintas damas, se esforçavam em levar vantagem aos cavalheiros. Três dias de completa expansão de alegria, sem os preconceitos, as dúvidas das convenções sociais, são os do carnaval em que tudo se esquece e desta vez até mesmo a conflagração europeia e a crise foram esquecidas.
O nosso povo divertiu-se à vontade durante os três dias e fez bem nisso! Que é a vida? Ela não passa ligeira? Tiremos ao menos esses três dias para gozar, rir, brincar com liberdade, de corpo e alma. Mas ia cometendo uma grande falta, a de não me referir, em especial, ‘à nota chic’ do terceiro dia que foi a do automóvel embandeirado e florido a carregar flores: distintas e galantes damas da nossa melhor sociedade e belas e mimosas senhoritas, todas vestidas à maneira feniana de vermelho e branco. Foi esse o encanto do último dia de festas, a nota harmoniosa que se desprendeu no espaço, o conto seráfico pelo espaço afora. Nesse automóvel, as gentis criaturas do belo sexo eram as aliadas que valentemente resistiam aos ataques que lhes faziam de confetes e lança-perfumes.
Quem nos dera que o carnaval fosse ao menos de uma semana!
Agora, eis-nos voltados ao labor, às amarguras, tristezas da vida e com os nossos espíritos preocupados com a ‘struggle for life’.
Adeus Momo! Adeus!
Quantas saudades!
Mas Deus há de permitir que para o ano damas distintas, senhoritas belas, estejam todas a postos para a loucura” (V.M.T, A Rua, nº 05, 21-02-1915).
Na foto abaixo, a publicação de Maria da Conceição de Avelar Andrade. “Acervo de fotografias de Eliana Machado. Concurso de fantasias no Iporanga Social Club. Presidente: Newton Fernandino. As carnavalescas são: Eliana Machado e Ana Cristina Perez Carvalho. Muito lindas! Tudo de bom! Época de ouro do carnaval de nossa terra”