Nossa História

A NOSSA HISTÓRIA: Vida, Espere por Mim!

“Chego em casa, abro a porta e entro. Que delícia. Aqui é o meu mundo e meu reino, onde exerço os meus mandos e desmandos. Sou senhora e rainha do meu espaço! Minha terra e meu céu. Meu esconderijo, onde guardo os meus tesouros, salvos, de até quarenta ladrões! Meu covil, onde abrigo os meus defeitos. Bandidos, que me perseguem faz tempo! Exorcizo os meus fantasmas. Sem máscaras, sem retrato, sem retoques, sem pudor. Sou eu mesma. Sou eu mesma. Sou eu mesma, como eu sou” (Do Poema de Dalva, Amauri da Matta, Março de 2024).

23/03/24 - 08:00

Por Amauri da Matta

Fiz essa canção a partir do poema de Dalva Augusta Marques – Meu Pequeno Grande Reino – publicado no seu livro de poesias e crônicas, “Vida, Espere por Mim”, escrito em 2004, com produção independente (pág. 51). Em março de 2022, tive o prazer de receber esse presente, das mãos da autora. Em dedicatória, ela registrou: “Dalva Augusta Marques. A Feliz!!! Caro Amauri ... Quando estamos com um livro nas mãos, temos a melhor companhia e, no entanto, estamos sozinhos. Na página 51, falo da verdade nossa de cada dia. Na página 76, há o texto de que mais gosto: a “Libertação” que precisamos ter. Dalva Marques, março-2022, dia 15, Terça-feira”. Despertou-me atenção o modo como ela se apresentou: “A Feliz”. Então, resolvi entrevistá-la, para saber de onde vinha essa tal felicidade (09-2023). Logo percebi que a autora, no auge de seus 88 anos, com uma memória inabalável, era de fato uma pessoa feliz. Em seu livro, escreveu: “Diga sempre: Sou feliz! Isso é definitivo! Não diga nunca: Estou feliz! Isso é passageiro! (A escolha é sua ..., pág. 41). 


Ao longo da entrevista, Dalva discorreu, passo a passo, a sua trajetória de vida, com um saudosismo de causar inveja ao mais otimista dos mortais. Falou do seu nascimento, em Cordisburgo, na Fazenda da Bela Vista, no Arraial de Lagoa Bonita (1º-12-1934). De quando foi estudar, em Curvelo, aos sete anos de idade (10-1941). De suas férias, quando ia de trem de Curvelo a Cordisburgo e, depois, seguia viagem, em carro de boi, até a Fazenda Brejinho: “Doce distante adolescência recordo. Recusa minh’alma este tempo olvidar: - Curvelo; - Curso Ginasial; - Colégio das Clarissas Franciscanas; Férias na Fazenda Brejinho. Estrelas ainda brilham e o carro de boi já nos espera.  Levar-nos à inadiável realidade é a sua missão. Valsando ainda em algum sonho, passava da cama quentinha para o colchão de palha na mesa do carro, estendido pelas bondosas mãos de Padrinho e Mãe Nova. A madrugada, em sua quietude, com agrado recebe: carreiro, boi, cantar do carro paciente, seguindo sorvendo a estrada, encurtando distância do destino nosso. Primeiros raios de Sol. Manhã e eu ainda bocejávamos, cidadezinha Cordisburgo avistada. Olho o que havia ficado para trás. Coração, de saudade apertado! Na bagagem, escondidas lembranças. A dor da despedida seria amenizada. Indiferente a tudo isso, o tempo passaria sem pressa até as próximas férias” (O tempo nos trilhos do trem, pág. 23). 


Gostava, muito, de duas coisas: andar a cavalo e cantar. Dalva diz ter namorado bastante, mas isso, na sua época, era “andar” e “dançar par constante”. Quando fez o seu voto de “solteirice”, aos 17 anos, foi a coisa mais fantástica da sua vida: “- Nunca vi tanto candidato! Se eu tivesse casado, tinha ficado viúva umas quatro vezes, pois a maioria dos meus “ex” morreram” – recorda sorrindo. Sua professora, no ginásio, depois da aula, sentenciou: sua aluna era uma pessoa especial, muito “esperada”, “desejada”. Ela não a conhecia, mas tinha razão, pois a irmã que lhe antecedeu – Dalva Augusta Oliveira, nascida em 1933 – faleceu com 3 meses de idade, causando grande comoção na família. Aqui, talvez, esteja a razão do título do seu livro: “Vida, espere por mim”. A escritora falou, ainda, de sua formação em Ciências Sociais e de sua chegada a Sete Lagoas, onde vive até hoje. Certo dia, encontrei-a no Coral Dom Silvério, num dos shows ali realizados, e, para minha surpresa, soube do seu carinho pelo maestro João Lucas, pois também foi sua aluna. Enfim, a autora traz, em suas poesias e crônicas, que inspiram canções, o simples pulsar do dia a dia, o amor pela família, e, acima de tudo, a força da mulher, de sua autonomia e liberdade. 
 

Amauri da Matta

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