Nossa História

Com o tostão do pobre e o conto de réis do rico, Sete Lagoas terá um novo hospital (I).

Lendo o Jornal Gazeta de Paraopeba, encontrei joia rara: uma entrevista do Dr. Márcio Paulino, feita pelo repórter Ataliba Siqueira, da Folha de Minas, de Belo Horizonte, em 1935, contando, em detalhes, sobre o início da construção do novo hospital de Sete Lagoas – a Casa de Caridade “Nossa Senhora das Graças”.

09/03/24 - 08:00

Por Amauri da Matta

O saudoso jornalista descreve, de uma forma bem romântica, a sua chegada à cidade, os bares “Sete Lagoas”, “Central” e “Lux”, com as magníficas radiolas tocando sambas e músicas carnavalescas, e os boêmios, bebendo e dançando. Na sequência, dirige-se ao Hotel Mendonça para descansar e, no dia seguinte, avistar-se com o Dr. Márcio Paulino: “Encontrei-o em sua residência, no recesso do seu lar, tranquilo, onde fui recebido com simpatia. Informei-o do objetivo da minha presença ali. O Dr. Márcio Paulino, de início, teceu grandes elogios à  FOLHA DE MINAS, indagando com carinho tudo o que interessava  de perto ao nosso jornal. 
O CAPITAL INICIAL. Dando começo à nossa palestra, que versou sobre a construção do novo hospital de Sete Lagoas, disse-me o Dr. Márcio Paulino: - O padre Diniz Costa, antigo vigário da freguesia de Inhaúma, deixou, em testamento, 100:000$000 (cem contos de réis), que se destinavam à construção de uma nova Casa de Caridade ‘Nossa Senhora das Graças’. Nessa época, a quantia não bastava para uma obra de vulto, um hospital afinal, que viesse a satisfazer as necessidades da população, que contava, e conta até hoje, com um único estabelecimento desse gênero; para uma cidade com uma população de cerca de 15.000 habitantes, não se tendo em conta o resto do município e a parte de outros municípios de onde vêm legiões de criaturas em busca de alívio para seus males do corpo. 
DOBRANDO O CAPITAL. Aquele dinheiro – continua o Dr. Márcio Paulino – foi depositado a prazo fixo, no Banco Agrícola de Sete Lagoas, onde, rendendo juros fora da tabela bancária, atingiu, na presente época, a quantia de 200:000$000 (duzentos contos de réis). Certa da cooperação do povo, a direção do hospital resolveu iniciar a obra, que representa, para o município de Sete Lagoas, se não for o maior, um dos maiores benefícios que esta terra pode ter. Ninguém está alheio ao movimento. O negociante modesto, o operável incansável, o fazendeiro, o industrial, as classes liberais, a magistratura, representada pelo íntegro juiz de direito da comarca, Dr. Alexandre Silviano Brandão, o prefeito, Dr. José Evangelista França, todos numa cooperação persistente, tendo a ampará-los nessa jornada humanitária a mulher sete-lagoana, trabalham com prazer pela consumação da obra que é, na realidade, de um alcance inestimável. 
O AMPARO MORAL E MATERIAL DA POPULAÇÃO. E prossegue o Dr. Márcio Paulino: - Iniciado o movimento, de todos os pontos do município,  tem vindo a contribuição caridosa e espontânea de quantos conhecem o valor de tal realização. Na primeira reunião, que teve lugar no Automóvel Club de Sete Lagoas, a lista de subscrição atingiu, em poucos momentos, a importância de 30:000$000 (trinta contos de réis). Nos distritos, não menos intenso tem sido o movimento em prol do novo hospital. Basta ver a contribuição altamente valiosa e significativa do povo de Inhaúma, Fortuna e Cachoeira de Macacos, onde as listas de angariação de donativos já atingem cerca de 25:000$000 (vinte e cinco contos de réis). Nos outros distritos, Jequitibá e Buritis, o movimento cresce entusiasticamente e as bolsas de sua gente se abrem liberalmente em favor da grande iniciativa. A contribuição do povo da cidade e a dos ferroviários têm sido magníficas, excedendo todas as expectativas, o que é bem um sintoma da alma filantrópica do povo de Sete Lagoas, nesta época de aperturas financeiras e dificuldades de vida as mais prementes. A campanha interessou também às casas de pasto, aos cinemas, aos botequins, aos bares, etc., onde foram afixados cartazes prevenindo o público de que a mercadoria vendida sofreria o acréscimo de um tostão, em auxílio das obras do hospital” (GAZETA DE PARAOPEBA, Ano 25º, Villa Paraopeba, 03-11-1935, Número 1.384). Ao encerrar este artigo, é bom destacar – como diz a matéria – que a campanha seguia vitoriosa, tendo, como amparo, a força da mulher sete-lagoana. Parabéns pelo seu dia!  

Amauri da Matta

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